PATRIMÔNIO CULTURAL: REVITALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
PATRIMÔNIO CULTURAL: REVITALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO. Pretende-se com este texto
discutir a importância do patrimônio como expressão de cultura e de identidade.
O conhecimento e a valorização dos bens culturais contribuem com o despertar
da cidadania e com a noção de que expressam a história e a tradição
local e regional, por isso, acredito que o patrimônio aguça o sentimento de
pertencimento. Sua revitalização é uma alternativa para o desenvolvimento que
viabiliza a inserção social da comunidade. Representa, ainda, um caminho para a
dinamização do turismo. O texto foi construído a partir de
reflexões que pretendem expor o valor do patrimônio como um dos alicerces
do desenvolvimento da sociedade.
PATRIMÔNIO E TENDÊNCIAS
Vivemos em uma sociedade de avanços tecnológicos, de facilidade de
comunicação e de deslocamento de pessoas, de integração econômica,
política e cultural, em que a globalização tornou-se algo comum em nossas
vidas. O ambiente de nosso cotidiano está cada vez mais padronizado. É por isso
que as diferenças e as diversidades culturais encontram espaço na sociedade do
século XXI.
Estamos redescobrindo o local em contraposição ao global, as manifestações
culturais, as tradições e as peculiaridades. Estamos (re)apreendendo a olhar
para o patrimônio como um bem que representa identidade e que exterioriza o
valor de uma cultura, de algo que pode ser a expressão de uma conjuntura
histórica, a leitura de uma concepção social ou a manifestação de uma
tradição. É justamente na exaltação no novo, na busca frenética da
adequação às tendências que reside a preocupação como o patrimônio, ou
seja, a valorização de bens que representam referências culturais
ou naturais que simbolizam a diferença e a diversidade, diante de um mundo em
que parâmetros globais são referências de vida.
A revitalização do patrimônio significa a ressignificação das
manifestações culturais, tornando-a viva, ao ganhar sentido
para as pessoas e, especialmente, ao aguçar a identidade. O patrimônio
pode ser definido como bem cultural, tangível ou intangível, que desperta o
sentimento de valor e identidade e que expressa a própria cultura. O homem, ao
construir um monumento ou um sobrado está manifestando sua cultura através do
estilo arquitetônico da obra. Podemos considerar em nossas discussões sobre
patrimônio de uma comunidade as festas e danças, pois são bens intangíveis,
resultados da expressão cultural.
O crescimento desordenado das cidades, a especulação imobiliária, as
mudanças dos comportamentos, os novos valores e estilos de vida podem
gerar impactos irreversíveis nos patrimônios, pois são fatores
resultantes da vida capitalista da sociedade globalizada. Por outro lado, a
revitalização é o movimento contrário, pois indica a retomada das discussões
sobre preservação, conservação e restauração do patrimônio e, essencialmente, a
preocupação com espaços e manifestações que permitem o olhar, a convivência, o
conhecimento e a interação com valores, histórias, símbolos e manifestações.
Considero que o homem do século XXI busca o conforto da tecnologia e reconhece,
cada vez mais, a necessidade de manutenção do patrimônio como elemento de
identidade, de herança cultural, de referência sobre um passado que precisa
estar vivo, para servir de equilíbrio perante a vida moderna.
PATRIMÔNIO E CIDADES
As cidades precisam oferecer para seus cidadãos espaços de
convivência, de lazer, de integração e de cultura, para que homens e mulheres
possam exercer o direito de uso coletivo, de “estar na rua ou no parque com
a família”, da (re)valorização das relações humanas, enfim, a cidade deve
ter em seus espaços lugares que oferecem qualidade de vida. Os cidadãos
identificam-se com lugares, na medida que reconhecem sua importância, que
assumem a condição de espaços de uso coletivo e que representem a identidade
local ou global.
Margarita Barreto discute as transgressões dos espaços públicos, o mau trato
dos lugares, a privatização das ruas, a insegurança urbana, geralmente
impulsionada pelo aumento dos índices de violência e o desprezo do poder
público e privado em relação ao patrimônio. O desejo da convivência cultural,
do lazer, do ideal da revitalização dos bens culturais esbarra nas
transgressões urbanas. Portanto, vivemos um momento crucial. De um lado a
preocupação com a violência que isola o homem nos apartamentos, nos condomínios
e nos shopping-centers ou nos muros que isolam as casas, o outro, a busca pelo
conhecimento cultural, o sentimento de que é necessário reviver tradições e
interagir com outras culturas. Para Barreto a resposta para a transgressão do
espaço público e coletivo “parece estar no repensar os grandes
conglomerados urbanos, partindo, de um planejamento que tome em conta as
necessidades humanas” (Barreto, 1999. p 52.)
As discussões sobre a revitalização do patrimônio passa, essencialmente pela
debate sobre o planejamento urbano, a formas de uso dos monumentos históricos e
do apoio às manifestações culturais. Nesse processo é importante a
participação da comunidade ou órgãos de classe, pois a (re)construção dos
espaços não se faz por decreto ou por decisões de técnicos. As pessoas,
residentes do lugar, devem participar, pois o conhecem e precisam ser
motivadas a fortalecerem o sentimento de identidade.
Discutir bens culturais é pensar na viabilidade da transformação
urbana, representa a necessidade de sonharmos com políticas de investimento na
reorganização do caos urbano. Jacques Le Goff, ao discutir o papel das
cidades, aponta para os descaminhos da excessiva concentração urbana e
nos demonstra a seguinte preocupação: a necessidade de recuperação da
função pública das cidades, dos espaços e convivência e de cultura, dos lugares de
formação e de exercício da cidadania. A cidade desvitalizada representa a
continuidade do descaso com o patrimônio, o seu uso indevido. A paisagem urbana
descaracterizada faz com que a sociedade se distancie das discussões sobre o
uso do bem cultural.
Marcelo Ribeiro, discute a importância da revitalização do patrimônio, na
medida em que reabilita o espaço urbano, fortalece manifestações culturais
descaracterizadas em sua tradição e o reconhecimento dos cidadãos em relação
aos bens culturais. Além disso, gera renda para a comunidade e para o
município. Ribeiro, discute o caso de Porto Alegre:
“No centro de Porto Alegre podemos identificar outra proposta de revitalização
e reutilização de espaços de grande porte que sofreram o processo de proposta
cultural. É o da conhecida Usina do Gasômetro, que se situa às margens do
Guaíba, que antigamente dividia espaço com um presidio público e era conhecida
como “ponta da cadeia”. Este espaço abriga diversas exposições, teatros e
show e possui como diferencial uma chaminé que se projeta de qualquer ângulo
como símbolo do passado: de gerador de energia passou a centro de cultura (...)
Pensar e planejar áreas de lazer aliadas a espaços ociosos da urbe e a sua
posterior valorização através de parques e praças com motivos culturais e
históricos são formas de resgate da cultura e homenagem a etnias que
habitam as cidades” (Ribeiro, 2000, 148 e149).
O caso de Curitiba é semelhante, pois a administração pública
conseguiu aliar áreas de lazer com a valorização da cultura de povos que
imigraram para a cidade. Ao mesmo tempo em que se valoriza diversidade
cultural do município, possibilita ao cidadão e ao turista espaços de lazer.
Há, em Curitiba e Porto Alegre exemplos de boa utilização do patrimônio
cultural. O uso deve ser resultado de uma política que envolva a
administração local, a comunidade e os órgãos de classe. Não necessitamos
fazer um opção entre a continuidade do caos urbano e a “construção da cidade
ideal”, temos que planejar e discutir a organização das cidades e pensar na
revitalização do patrimônio. Como sugere Le Goff, é necessário expressar nosso
amor pelas cidades e pelos bens culturais
PATRIMÔNIO AMBIENTAL E CULTURAL
Entre muitas regiões do Brasil que se caracterizam pela riqueza do
patrimônio ambiental e cultural, decidimos discutir e apresentar a
singularidade do Vale do Paraíba, pois é uma região viável para a consolidação
de políticas e investimentos na preservação do patrimônio e na manutenção da
identidade cultural. A globalização se consolidou em algumas cidades que ainda
mantêm as tradições da cultura e a exuberância do meio ambiente. O Vale
do Paraíba paulista caracteriza-se pela localização geográfica: é cercado
pelas Serra da Mantiqueira e pela Serra do Mar, é uma região de elo entre os
Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Na região, encontramos trilhas, cachoeiras, picos (por exemplo,
o Pico da Mina em Queluz ) parques estaduais, áreas de proteção ambiental e
um “mar de morros”, o que indica a diversidade do patrimônio
natural. Muitos lugares não são ocupados pelas cidades, aliás, os municípios em
que o processo de industrialização e modernização não se consolidaram,
apresentam espaços propícios para o desenvolvimento do turismo de aventura ou
rural. Instituições como o SEBRAE e ONGs têm contribuído com o desenvolvimento
da ocupação ordenada da área rural, através de empreendimentos turísticos. O
envolvimento da comunidade rural e de empresários que possuem terras, fazendas
e produções agropecuárias, com o turismo, permitiu o aumento do fluxo de
visitantes. Ao mesmo tempo, a consciência de que o meio ambiente precisa ser
respeitado, tem despertado na sociedade o sentimento de preservação
ambiental e de investimento em empreendimentos turísticos. Através da regional
de Guaratinguetá, o SEBRAE é um exemplo de incentivo ao turismo em Cunha,
Bananal, Areias e Queluz, desenvolvendo programas específicos.
Entendemos que as atividades em áreas rurais podem contribuir com a
comunidade e com as políticas de preservação do patrimônio ambiental. Segundo
Moletta, a atividade turística no meio rural “significa um meio para aumentar a
sua renda mensal, de forma harmônica, valorizando sua propriedade e o seu
estilo de vida”. Representa a oportunidade do homem urbano “resgatar suas
origens culturais, o contato com a natureza e a valorização da cultura local”
(MOLETTA, 1999. p. 9). Obviamente, esse tipo de atividade pode trazer
impactos negativos para o patrimônio ambiental e para a cultura do homem do
campo. A mudança de hábitos, a degradação do local, a descaracterização da
cultura e o excesso de lixo, são fatores que inviabilizam o desenvolvimento
sustentável. O envolvimento da comunidade rural, de instituições compromissadas
com o meio ambiente e com a cultura são fundamentais para que os impactos não
acarretem transformações significativas.
Da mesma forma, podemos discutir a importância de nossos parques,
cachoeiras, trilhas e picos. Como conciliar a visitação e o turismo no Parque
Estadual, Horto Florestal e no Pico do Itapeva em Campos do Jordão, no
Parque da Nacional da Serra da Bocaina entre Bananal e São José do Barreiro, na
Cachoeira dos Veados ou de Santo Isidro, que ficam nesse parque, ou
mesmo, na Trilha do Ouro que corta a Bocaina? Instituições como o IBAMA, SOS
Mata Atlântica e ONGs são fundamentais para a preservação ambiental e devem
exercer papel de orientação para a ocupação. As Instituições de Ensino Superior
e o Instituto de Estudos Valeparaibanos também devem colaborar como políticas e
ações para a preservação do patrimônio ambiental. As instituições precisam, com
urgência, consolidar projetos de parcerias para atuarem de forma conjunta, não
fragmentando investimentos e os recursos humanos.
A cultura e a história regional é marcada pelas “Fazendas do Café” e palas
Festas profanas e sagradas, em que os barões, escravos, comerciantes, padres,
tropeiros, viajantes, advogados, homens pobres e livres, entre outros, foram
agentes da história e representam diversidade e identidade
cultural. Como herança cultural temos as festas, danças e a
culinária. Celebrações como a Festa do Divino e de São Benedito marcam o
calendário nacional e são intensamente comemorados no Vale do Paraíba. As
manifestações ocorrem entre um elo de tradições e novos comportamentos, típicos
da dinâmica cultural da modernidade.
As fazendas do café, símbolos do poder e da economia do século XIX,
representam na atualidade, uma oportunidade para seus proprietários, pois podem
transformá-las em locais turísticos. É o que ocorre em fazendas como Boa Vista
e Três Barras em Bananal, Paineiras em São Luís do Paraitinga, Pasto Grande em
Taubaté, Fazenda Amarela em Lorena ou Boa Vista em Roseira (MAIA, 2000). São
patrimônios que se revitalizam para abrigar hotéis ou locais para visitação. A
transformação desses locais representam uma alternativa para os
proprietários evitarem “falência do local”; no sentido de que as demais
atividades econômicas ( pecuária e a produção de leite) não viabilizam os
custos de manutenção e impedem os investimentos de revitalização do patrimônio.
Em Barra do Piraí, (Rio de Janeiro), através da Fazenda Ponte Alta (os
proprietários recebem os turistas com vestimentas e música do século
XIX), e em Carandaí (Minas Gerais), na
Fazenda Estalagem ( preservação da mata e das construções),
as atitudes dos proprietários vão no mesmo sentido. Observa-se que os
investimentos nas fazendas, realizadas com pesquisas e pessoal competente e
comprometido, consolidam a revitalização e possibilitam a utilização adequada
do patrimônio.
O Vale do Paraíba, necessita de cidades que respeitem os espaços urbanos e
públicos, pois existem cidades como São José dos Campos e Jacareí que se
industrializaram e se modernizaram e ainda mantêm o patrimônio
cultural e ambiental. Do outro lado, temos exemplos de cidades como Cunha,
Silveiras, Areias, Queluz, São José do Barreiro, Arapeí, Bananal e São Luís do
Paraitinga, que possuem um legado ambiental e cultural que simbolizam a
riqueza e a originalidade do Vale do Paraíba, como região em que o patrimônio
necessita de cuidado e profissionais
competentes.
PATRIMÔNIO E IDENTIDADE
A preservação do patrimônio tem entre suas funções o papel de realizar “a
continuidade cultural”, ser o elo entre o passado e o presente e nos permite
conhecer a tradição, a cultura, e até mesmo quem somos, de onde viemos.
Desperta o sentimento de identidade. Margarita Barreto defende a “recriação de
espaços revitalizados”, como um dos fatores que podem “desencadear o
processo de identificação do cidadão com sua história e cultura (Barreto, 2000.
p.44).
No século XX a sensação da fragmentação da identidade, da perda das referências
culturais, despertou no homem o desejo de “retorno a algo perdido”, ou seja, a
necessidade de buscar manifestações culturais que pertencem a seu passado vivo,
a comportamentos que deixaram de ser comuns, pois o frenesi contemporâneo exige
atitudes da sociedade globalizada.
Pertencer a uma identidade cultural, significa descobrir-se, ser diferente
dos comportamentos globais. Por isso, patrimônios culturais intangíveis como as
formas de manifestações lingüísticas, de relacionamento, de trabalho com
a terra e a tipificidade da culinária, o cultivo e o preparo do vinho, os
passos das danças tornaram-se patrimônios da cultura e demonstram a riqueza da
relação entre identidade e diversidade da cultura brasileira.
O Centro Unisal, o Instituto de Estudos Valeparaibanos, os
historiadores, arquitetos, os jornalistas, os antropólogos, os arquitetos e os
jornalistas, entre outros, demonstram-se preocupados com o uso do
patrimônio, com a descaracterização de casarões, fazendas e outras construções
de caráter histórico e com a banalização de rituais, danças e comportamentos,
por sua exposição e uso indevido. Podemos citar como exemplo a
apropriação pelos agentes de turismo dos bens culturais, que podem se tornar
espetáculos, shows e renderem-se ao apelo capitalista, deixando de serem
elementos de uma tradição, de uma cultura ou monumentos que representam
determinado momento histórico, para se tornarem exclusivamente atrativos
turísticos, perdendo a referência com a comunidade e com história.
Concordo com Barreto quando afirma que a revitalização do patrimônio tem
contribuído para a: “recuperação de identidades locais ameaçadas em todas as
partes do mundo pelo avanço de uma única cultura hegemônica, que se impôs nas
últimas décadas na música, no vestuário, na alimentação, nas formas de lazer e
de consumo” (Barreto.2000, p.44)
A dinâmica dos tempos nos revela que as culturas não se
congelam, adaptam-se. As trocas culturais são comuns. Por outro lado, as
comunidades que se organizam para revelar seu patrimônio, que assumem sua
identidade e que recuperam formas tradicionais de culinária, danças e festas
estão tendo oportunidade de revelar para a sociedade globalizada suas
diferenças, peculiaridades e modos de comportamento. Está, justamente, no ser
diferente que reside a geração de renda, emprego e visualização de que a
tradição cultural deve ser encarada como identidade da comunidade, fazendo com
que as pessoas não necessitem ser como todos são.
Não tenho dúvida de que a cultura globalizada, de que o comportamento
tipicamente consumista e capitalista geram impactos, interferem nos
comportamentos tradicionais, transforma bens culturais em produtos de consumo.
Por isso, a revitalização e os estudos sobre as formas de uso e interação com o
patrimônio devem ter profissionais capazes de pensar nestas questões, de
apontarem alternativas. As pesquisas e debates devem ser multidisciplinares e
terem como referência a comunidade e seu patrimônio. Barreto escreve sobre os
equívocos da revitalização; defende, porém, estudos que proporcionem a
manutenção da identidade. A recuperação da memória fortalece a cidadania e a
valorização do patrimônio.
Barreto afirma que:
“Embora todos os problemas antes mencionados sobre a transformação da
história e do patrimônio em bem de consumo e o fato real de que há uma
ressignificação nesse processo, acredita-se que é sempre uma melhor opção do
que o esquecimento da história, do que a marginalização de bairros ou do que a
derrubada de prédios por causa da especulação imobiliária”
(Barreto. 2000, p.51).
PATRIMÔNIO E COMUNIDADE
Ao pensarmos na revitalização do patrimônio, temos que necessariamente
discutir, os mecanismos de tombamento, os recursos financeiros e humanos
disponíveis e as alternativas de uso. Acima de tudo, o processo de
revitalização tem que ser benéfico para a sociedade, ao transformar o lugar em
um espaço agradável para os cidadãos e para os turistas. Deve, ainda,
respeitar as características culturais da população e da arquitetura das
construções, não podendo distorcer o seu significado artístico.
O uso adequado do patrimônio tem que exercer duas funções: garantir o
respeito à cultura, inclusive no que se refere aos estilos artísticos e
garantir o significado histórico e a comunidade, que não pode ser excluída do
processo de decisão sobre o uso do patrimônio ou mesmo dos benefícios
econômicos advindos da atividade turística. O desenvolvimento tem de
representar a inserção social, pois entendo que a participação é essencial para
que os impactos não degradem o lugar e os confrontos entre comunidade e
turistas não se estabeleçam; além disso, o lugar deve gerar empregos para a
comunidade, oportunidade de comercialização do artesanato e de prestação de
serviços. Paralelamente, as escolas necessitam fortalecer os estudos sobre a
história e cultura local.
Ulpiano Meneses discute de forma consistente a questão do uso da cultura.
Coloca como temas para reflexão problemas como a cenarização das cidades, o
fetichismo da cultura, o consumo do bem cultural, o desenraizamento dos
turistas, ou seja, põe em debate o tipo de turismo que praticamos. Em sua
análise, as alternativas para o desenvolvimento do lugar através do turismo não
são analisadas. Entendo que são questões sérias que devem compor a pauta das
discussão sobre os empreendimentos turísticos. Mas temos que levar em consideração
experiências mundiais: a revitalização do patrimônio têm contribuído para o
desenvolvimento dos lugares; manifestações culturais estão se fortalecendo e as
comunidades percebem que a riqueza da identidade representa um impulso à
continuidade da herança cultural e a geração de emprego e renda.
PATRIMÔNIO E FORMAS DE USO
Num momento em que redescobrimos o valor do patrimônio, como elemento de
identidade cultural, torna-se comum a discussão sobre as formas de
seu uso. Percebemos lentamente o interesse do governo federal e até mesmo dos
gestores estaduais pelo patrimônio. Países europeus como Espanha, Portugal,
Itália, Alemanha, França, República Tcheca e outros perceberam que investir na
restauração e preservação dos bens culturais, trouxe o benefício da dinamização
do turismo, ao mesmo tempo que fortaleceu a identidade nacional.
Consequentemente, empresários e sociedade organizada se beneficiaram com o
aumento da riqueza interna, pois o turismo gerou negócios e empregos. Os
patrimônios possuem a estrutura necessária para receber os turistas, que
encontram sinalização adequada, folhetos, guias e uma série de serviços
para a visitação do bem cultural.
Américo Pelegrini apresenta vários exemplos de patrimônios usados para fins
culturais e que viabilizam a manutenção de heranças culturais, assim como, o
consumo da própria cultura (PELLEGRINI FILHO, 1993. págs 112 a 116) A
argumentação de Margarita Barreto sobre o uso do patrimônio são interessantes,
ao indicar que um centro histórico ou bairro revitalizado pode se transformar
em “site museums”, entendidos como “museu de sítio” ou, ainda,
“museu no local”, onde os espaços podem ser preparados para representar uma
época: construções, vestuário, culinária e costumes devem “espelhar” uma época,
fazendo com que os visitantes conheçam a história e a cultura (BARRETO, 2000. p
58 e 59). É, inclusive, uma forma da população local conhecer-se e discutir sua
identidade.
Os site museums, permitem a sustentabilidade econômica do lugar, pois atraí
turistas e investimentos, por outro lado, há perigo de tornar estes
lugares cenários sem vínculos com a comunidade, servindo de bens de consumo ou
lugares em que o setor privado se beneficia com os lucros e a comunidade
transforma-se, unicamente, em uma referência da cultura, não participando do
processo das decisões sobre o planejamento turístico do lugar. O sucesso destas
experiências deve representar o desenvolvimento que mantenha a herança
cultural, que insira a comunidade e que amplie os investimento, os empregos e a
renda do lugar. É fundamental que o empreendimento seja precedido de pesquisas,
de um sério trabalho de restauradores, historiadores, arquitetos, antropólogos
e outros profissionais capazes de contribuir com a reconstrução de época.
Portando, o fortalecimento da identidade cultural, passa necessariamente
pela questão do patrimônio, como elemento que fortalece o sentimento de
pertencimento a uma comunidade, cultura ou tradição, que permite realizar o elo
entre passado e presente. Tornar um casarão ou fazenda do século XIX um museu
representa o fortalecimento da identidade cultural, da geração de conhecimento,
e de formação para os cidadãos e fundamentalmente para o desenvolvimento
sustentável.
Temos que discutir sistematicamente a revitalização dos lugares de turismo,
ampliando os espaços de manifestação cultural e de lazer, criar mecanismos
de preservação do patrimônio, para que nossas identidades culturais
se fortaleçam, ou mesmo, para que possamos compreender nossa
diversidade, tornando o patrimônio uma referência da história e tradição. É
necessário ampliar o senso de cidadania e viabilizar o seu uso de forma
adequada para que possa ser um fator de conhecimento, formação, interação e
geração de renda e emprego.
Fábio José Garcia dos Reis
BIBLIOGRAFIA
BARRETO, Margarita. Turismo e legado cultural. Campinas:
Papirus, 2000.
GASTAL, Susana (org.). Turismo: 9 propostas para um saber fazer.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000.
LE GOFF, Jacques. Por amor às cidades. São Paulo: Editora
da UNESP, 1988.
MAIA, Thereza Regina de Camargo. O Vale Paulista do Rio Paraíba:
história, geografia, fauna, flora, folclore e cidades. Aparecida:
Santuário, 2000.
MOESCH, Marutschka. A produção do saber turístico. São
Paulo: Contexto, 2000.
MOLETTA, Vania Florentino. Turismo rural. Porto Alegre:
SEBRAE/RS, 1999.
PELLEGRINI FILHO, Américo. Ecologia, cultura e turismo.
Campinas: Papirus, 1993.
PIRES, Mario Jorge. Lazer, turismo e cultura. São Paulo:
Manole, 2001.
RIBEIRO, Marcelo. A atratividade dos centros urbanos e o turismo. In:
GASTAL, Susana (org.). Turismo: 9 propostas para um saber fazer.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000.
RODRIGUES, Adyr Balastreri (Org.) Turismo: desenvolvimento local.
São Paulo: Hucitec, 1997.
MENEZES, Ulpiano T. Bezzerra. Os “usos culturais” da cultura. Contribuição
para uma abordagem crítica das práticas e políticas culturais. In: YÁZIGI,
Eduardo, CARLOS, Ana Fabri Alessandri, CRUZ, Rita de Cássia Ariza
da. Turismo: espaço, paisagem e cultura. São Paulo,
Hucitec, 1999.
0 Comentários:
Postar um comentário