Marketing de Guerrilha
Que tal causar impacto, ver sua empresa bem falada e não
gastar muito? Se você gostou da ideia, é hora de aderir ao Marketing de
Guerrilha. Suas táticas inspiradas nas ações de milícias do mundo inteiro estão
fazendo uma revolução no mundo dos negócios.
Era 1941. Aviões da Alemanha bombardeavam a cidade de Belgrado enquanto tropas
nazistas marchavam sobre a Iugoslávia. Parecia impossível conter o avanço
germânico. Mas um pequeno grupo de soldados decidiu revidar. Eles não tinham
recursos – faltavam armas, comida, medicamentos – mas eram extremamente
criativos e organizados.
Decidiram, então, surpreender as tropas inimigas
realizando ações imprevisíveis e de emboscada. Deu tão certo que os partisans,
como ficaram conhecidos, recuperaram seus territórios e, de quebra, entraram
para a história como os guerrilheiros que atrapalharam os planos de Hitler.
Os partisans iugoslavos não foram os únicos guerrilheiros a provar que – mesmo
sem muitos recursos, mas com uma boa estratégia – é possível enfrentar grandes
exércitos. Os vietnamitas contra os norte-americanos, os russos contra
Napoleão, Che e Fidel contra a ditadura em Cuba e até Davi contra Golias –
todos eles elaboraram as táticas que hoje definem o Marketing de Guerrilha:
criatividade, planejamento, poucos recursos e ousadia para surpreender o
adversário.
"Assim como a guerrilha, o marketing de guerrilha mostra que,
mesmo quando os recursos são escassos, é possível causar impacto e chamar a
atenção. Basta ter um bom planejamento e um jeito de pensar criativo, que fuja
do convencional", explica Ariel Legmann, diretor de planejamento da
Agência Hurra, de São Paulo, especializada em Marketing de Guerrilha.
Mas, tanto na guerra como nos negócios, é preciso saber usar
as armas certas, ter um excelente conhecimento sobre o terreno e descobrir a
oportunidade ideal para agir. "São ações criativas, que se baseiam em
meios alternativos de comunicação e que precisam ser bem estruturadas",
explica Jeferson Mola, professor do curso de Marketing da Universidade Anhembi
Morumbi, em São Paulo. Quer conhecer essas ações? Então, leia o manual – ou
melhor, siga as cinco lições abaixo, elaboradas para quem deseja se tornar um
guerrilheiro do mercado.
O uniforme
Não estamos falando do uniforme dos funcionários nem da roupa que você usará na próxima reunião. Ok, o traje correto é sempre importante. Mas, nesse caso, trata-se de como você irá vestir sua empresa, ou seja, como a apresentará ao público. Comece pelo nome.
De acordo com Jay Conrad Levinson, autor de "Marketing de Guerrilha", a melhor opção é aquela que se diferencia da concorrência e é fácil de memorizar. Se o nome puder contar uma história, evocar uma ideia, sugerir um benefício, melhor ainda. E, se causar desconforto, é perfeito! "Os grandes nomes provocam as pessoas, chamam a atenção e correm riscos. Eles simplesmente não se encaixam", argumenta Levinson.
O nome ideal também precisa ter vida longa e se manter atual mesmo depois de
100 ou 150 anos. O mesmo vale para o slogan e para as ideias associadas à sua
marca. Quem já passou dos 30 anos ainda deve ter, na ponta da língua, as frases
utilizadas nos anúncios do adubo Maná ("Com Maná, adubando, dá!"),
nos comerciais do achocolatado em pó Nescau ("Energia que dá gosto!")
ou nas campanhas da Caloi ("Não esqueça a minha Caloi!").
Além de
fáceis de memorizar, elas não prometiam nada além do que poderiam cumprir.
Também apresentavam a empresa sem recorrer a superlativos, o que nos leva à
próxima lição: não subestimar a inteligência do consumidor.
Afirmar o que sua empresa, produto ou marca não é equivale a usar uma roupa
maior ou menor do que o seu tamanho: simplesmente, não fica bem.
"No passado, o discurso publicitário permitia às empresas falarem o que quisessem: que seu produto era o melhor, o mais completo, o mais versátil, o mais utilizado. Hoje, isso não funciona, pois as pessoas estão mais críticas e têm acesso à informação", diz Gustavo Fortes, sócio-fundador da Espalhe, agência especializada em Marketing de Guerrilha sediada em São Paulo. Segundo ele, quem insiste nesse discurso corre o risco de ser ignorado ou criticado pelo público. "O pior é que muitas empresas que fazem isso também não sabem lidar com críticas e entram em pânico nessas horas."
Requisitos como rapidez, qualidade, organização, atendimento e comunicação
também irão definir como o consumidor irá olhar para o produto, marca ou
serviço. E, convenhamos, se ele gostar, fará questão de comentar com os amigos,
vizinhos e familiares. É assim que começa o boca a boca, objetivo final do
marketing de guerrilha. Mas, antes de falar sobre isso, vamos escolher as
armas.
As armas
Não é preciso um arsenal caro nem complexo. No marketing de guerrilha, a regra é justamente o contrário: gastar pouco e, ainda assim, causar impacto. Como fazer isso? Pra começar, deixe de lado as mídias tradicionais – como TV, jornais e outdoors – por que elas simplesmente são mais caras. Além disso, essas são exatamente as armas dos seus inimigos.
Guerrilheiros de verdade não pensam no óbvio e estão o tempo todo surpreendendo seus adversários. "Antigamente, para uma empresa ser reconhecida, precisava de um grande orçamento de marketing, que permitisse investir pesadamente em mídias de massa e, consequentemente, ser lembrada. Hoje, para ser reconhecida, ela precisa sair do óbvio", garante Gustavo Fortes.
As armas dos guerrilheiros estão espalhadas por todos os lados. Podem ser um
aparelho celular, um serviço de e-mail, uma rede social, uma estação de metrô,
um semáforo de trânsito, uma escada rolante e até numa melancia! Foi isso o que
a Espalhe levou em conta na hora de divulgar o novo sabor do chiclete Trident.
A agência aproveitou o carnaval carioca – época em que todo mundo quer chamar
atenção – e instalou cabines em vários pontos da cidade.
Nelas, as pessoas colocavam o novo chiclete sobre si (numa referência ao dito popular que manda quem quer aparecer pendurar uma melancia no pescoço) e eram filmadas durante 30 segundos. "Elas cantaram, pularam, dançaram. Os vídeos eram, então, postados em tempo real no Youtube", conta Gustavo. Houve fila na porta das cabines e ação ganhou espaço em jornais, blogs e revistas. "Todo mundo queria ser visto e isso repercutiu muito a marca", comenta.
A Biruta Mídias Mirabolantes, agência com sede no Rio de Janeiro, também recorreu
a uma arma inusitada para promover um dos combustíveis da Shell: o trânsito de
São Paulo. Atores vestidos como Mecânicos Shell V-Power simularam, nos
principais semáforos da cidade, troca de pneus, abastecimento e limpeza de
vidros dos carros como se fosse um pit stop, enquanto os motoristas ganhavam
brindes.
"A estratégia de guerrilha tem que ter um custo relativamente
baixo, interagir com o cotidiano das pessoas e ter uma grande capacidade de
repercussão. E foi isso o que fizemos", lembra Rafael Liporace, sócio e
diretor geral da agência.
Os itens do arsenal podem incluir intervenções urbanas,
redes sociais, mídia espontânea, flash mobs, virais, entre outros. Dependendo
da ação, é possível usar uma ou mais armas. No entanto, só um conselho: antes
de escolher a sua, estude o terreno.
O terreno
Você sabia que 90% das compras que realizamos são motivadas por nosso inconsciente? É o que diz Jay Conrad Levinson, no livro "Marketing de Guerrilha". Nossas decisões mais consumistas, de acordo com ele, são tomadas pelo lado emocional e justificadas pelo lado racional, para não nos arrependermos logo em seguida. É assim que muita gente se rende a uma roupa, um celular novo ou a um carro novo. E, pelo menos na maioria das vezes, o diálogo entre razão e emoção dá certo.
O dado acima é apenas um entre milhares de outros que os guerrilheiros precisam
conhecer sobre o comportamento do consumidor – que, por sinal, é o terreno do
qual estamos falando. "O marketing de guerrilha estuda a fundo quem é seu
público e as ações são programadas para atingir as pessoas em seu dia a dia,
gerando uma experiência que causará impacto e, em consequência, irá estimular o
boca a boca. Quanto mais específico for o público, quanto mais atingirmos o
chamado nanopúblico – que é aquele consumidor que tem exatamente o perfil-alvo
– maiores são as chances de a mensagem ser retransmitida", conta Ariel
Legmann.
Para uma campanha de guerrilha dar certo, investigue o relevo. Isto é,
questione: Qual a idade do seu público? Onde essas pessoas circulam? O que
pensam e desejam? Como reagem? A partir daí, organize o ataque. Foi isso que a
agência Fischer+Fala fez durante o último Campus Party, evento brasileiro que
reúne apaixonados por tecnologia. "Nossa intenção era fazer o
pré-lançamento do UploadFF, uma plataforma em que as pessoas podem cadastrar
ideias que reúnam tecnologia e interatividade. Para isso, utilizamos uma
estratégia de emboscada, que consistia em monitorar os comentários feitos pelo
público no Twitter e supreender quando uma pessoa reclamava de algo",
conta Thaís Fabris, diretora de convergência da Fischer+Fala.
Se a queixa era fome, a agência providenciava uma refeição para o twitteiro. Se
alguém reclamava do calor, era imediatamente presenteado com um ventilador
portátil ou um abanador, e assim por diante.
O objetivo, que era gerar boca a
boca, foi alcançado em pouquíssimo tempo. "Em apenas cinco horas, tínhamos
impactado cerca de 100 mil pessoas na internet, incluindo Twitter e Facebook",
avalia Thaís.
Reconhecer os clientes e compreender as necessidades deles é essencial para
quem deseja dominar o terreno da guerrilha. Mas não é só isso.
Ao se relacionar
com o consumidor, lembre-se de ser honesto, ético, facilitar a negociação e a
comunicação. E, acima de tudo, apenas inicie uma campanha de guerrilha quando
realmente tiver algo para informar. Do contrário, o tiro pode atingir seu pé.
Os inimigos
Seu maior adversário não está na porta ao lado, nem na empresa concorrente. Está em você mesmo, ou melhor, na falta de um bom planejamento e de conhecimento sobre o seu público-alvo. "Muitas empresas acham que basta ter uma boa ideia e isso será suficiente. Mas isso não é verdade, afinal, todo mundo tem boas ideias.
O que importa é a execução, o planejamento
e pensar em todas as possibilidades", lembra Rafael Liporace.
Outro erro comum é pensar que guerrilha é sinônimo de guerra e de uma ação
agressiva.
"Não obrigatoriamente. Fazer algo forçado, que não tenha a ver com o
cotidiano das pessoas ou que cause algum tipo de incômodo, que choque o
público, pode causar o efeito inverso, uma repercussão negativa", diz ele.
Imagine, por exemplo, se na época dos atentados ao metrô de Londres, uma
misteriosa caixa de madeira caísse de para-quedas na estação ou no meio da rua.
A campanha, realizada pelo Canal Fox para divulgar a série "Lost" em Portugal, certamente teria repercutido mal nesse outro contexto. Ou imagine o outdoor do filme "Kill Bill", que parece respingar sangue na calçada e nos carros, fosse instalado hoje, na Líbia. Sim, seriam tiros no pé.
"Os maiores equívocos que já vi, no que se refere ao marketing de
guerrilha, foi quando se deixou de seguir o seguinte fundamento: conhecer o
público a quem se destina, entender seu comportamento e não subestimar seus
pensamentos", explica o professor Jefferson Mola. De acordo com ele, as
ações obtêm o resultado inverso ao esperado porque o público-alvo não é bem
definido, o comportamento do consumidor não é corretamente avaliado ou os
sentimentos desencadeados pela ação confrontam a ética e a moral. Percebeu o
perigo?
A vitória
O objetivo do marketing de guerrilha é garantir o boca a boca. Ou seja, sua marca, empresa ou produto precisa ser falado, elogiado, retuitado, compartilhado, visualizado. Para isso, é preciso chamar a atenção de um público-alvo, mesmo que ele seja restrito. A partir daí, essas pessoas passarão adiante a mensagem, influenciando outras, que influenciarão outras, e assim por diante.
Mas será que existe um momento ideal para agir? "O profissionais de
Marketing devem ficar atentos às oportunidades que o mercado apresenta e
usá-las de forma inteligente, ou seja, de forma coerente, respeitosa e
criativa", aconselha Jeferson Mola. "O momento certo é quando se tem
uma novidade e se quer fazer barulho sobre aquilo, para que todo mundo fique
sabendo", sugere Thaís Fabris.
Já que a meta do marketing de guerrilha é gerar falatório, não dá para ter medo
de interagir com os consumidores nem tapar os ouvidos para o que eles têm a
dizer. "Os profissionais de Comunicação e Marketing precisam lembrar que,
hoje, todo mundo está falando e gosta de falar. As pessoas comentam o tempo
todo on-line, compartilham suas opiniões, suas experiências. Se você faz um
esforço e investe em algo que não irá repercutir, não faz sentido", avalia
Ariel Legmann.
Não é à toa que, na hora de medir o sucesso de uma campanha, vale contar o
número de visualizações de um site, de menções no Twitter, de cliques do botão
"curtir" no Facebook, de exibições de um vídeo no Youtube. "Se
as pessoas estão comentando ou passando adiante, seja um vídeo, um link ou uma
notícia, o esforço terá valido a pena", diz Ariel.
Os partisans fizeram isso. A ousadia do pequeno exército iugoslavo que, sem
recursos, tentou barrar o avanço nazista gerou tanto boca a boca que mais
pessoas aderiram à luta. Se não fosse por isso, eles nunca teriam atrapalhado
os planos de Hitler.
Be-a-bá da guerrilha
Intervenção urbana: elementos de rua – como postes, faixas e calçadas – são as armas e também ajudam a compor o cenário da guerrilha
Free mídia: é a mídia
espontânea. Ocorre quando a ação repercute a ponto de virar notícia em TV,
revistas, rádios, blogs ou jornais.
Corpo a corpo: quando atores e
modelos abordam ou se aproximam do público, promovendo a interação com a marca.
Viral: quando vídeos engraçados
e curiosos se espalham por sites e redes. A contaminação é rápida e pode
repercutir durante dias ou semanas.
Marketing invisível: a empresa
se esconde por trás de uma pessoa contratada para opinar positivamente sobre
produtos ou serviços. O público não percebe que é publicidade.
Redes sociais: são comunidades
on-line, como Twitter, Facebook, Orkut, Foursquare e GetGlue. Uma marca
comentada por um usuário repercute entre seus amigos, entre os amigos desses e
assim por diante.
Memórias do front
Com ousadia, criatividade e, às vezes, uma clara intenção de emboscar o concorrente, algumas ações de guerrilha valem a pena ser lembradas.
Clássico da emboscada
Em plena Copa do Mundo de 1994, a cerveja Brahma chamou mais atenção do que a patrocinadora oficial do evento, a Antárctica. Tudo porque incentivou torcedores e jogadores a levantarem o dedo indicador como símbolo da vitória. A imagem dizia também outra coisa: "a cerveja número 1".
Que flagra!
A cerveja Bavaria também tentou emboscar a Budweiser na Copa de 2006.
Distribuiu bermudas com sua logomarca aos torcedores do jogo entre Holanda e
Costa do Marfim. Na entrada do estádio, o flagrante: a organização barrou a
investida. Os torcedores não tiveram dúvida, tiraram as bermudas e assistiram à
partida usando cueca. É claro que repercussão foi ainda maior.
Grande causa
Para divulgar o site ParPerfeito, a Biruta Mídias Mirabolantes lançou o
Movimento dos Sem Namorado. Os solteiros de plantão foram convocados, no
esquema boca a boca, para participar de uma passeata no Dia dos Namorados.
Funcionou: nas ruas do Rio de Janeiro, o público marchou com cartazes pedindo
"Namoro Já". Veja o vídeo:
Tudo pela fama
Borá, no interior paulista, foi escolhida para o lançamento do Hall XS. Ali, a
agência Espalhe organizou o "Halls da Fama", convidando os moradores
a elegerem as dez pessoas cujos atos mereceriam reconhecimento. A ação durou
quatro meses e envolveu 805 pessoas – toda a população da cidade, que é a menor
do Brasil em número de habitantes. Veja o vídeo:
Todo mundo dançou
Foi em Chicago, em 2009, que ocorreu o maior flash mob da história. Quando a
apresentadora Oprah Winfrey convidou o grupo Black Eyed Peas para um show ao ar
livre, não desconfiava que 20 mil pessoas iriam dançar juntas a mesma
coreografia. Nem a banda sabia. Os músicos ensinaram os passos para um grupo
que fez questão de passar adiante.
0 Comentários:
Postar um comentário