Na Science: “Quanto mais quente é uma discussão na Internet, menos as pessoas refletem sobre o assunto”
título original: Por que não há comentários no Oene
Pedro Burgos, no OENE
Talvez você já tenha notado este detalhe. Acabou o post e não há uma caixinha para você escrever a sua opinião, ao contrário de outros sites internet afora. Antes que alguém grite que isto é um atentado à uma definição específica de liberdade de expressão, permita-me explicar qual é a ideia por trás disso.
Em princípio, sou a favor de comentários, e acho que todo mundo é, na teoria. Quando saí do jornalismo impresso para escrever online, repetia para todos os colegas que ficaram presos ao papel como era legal poder escrever algo e saber rapidamente se o público gostou ou não, quais as falhas no argumento, que erros factuais precisavam ser corrigidos, o que poderia ser acrescentado. Depois de 3 anos à frente do Gizmodo Brasil e outros tantos em blogs pessoais, posso dizer que ter uma área de comentários me ajudou bastante a desenvolver melhor minhas ideias.
Mas a caixa de comentários também é uma grande fonte de estresse para quem mantém um site e quer criar e fomentar algo como uma comunidade de comentaristas. Especialmente quando se trata de assuntos mais polêmicos (na internet, quase tudo), é preciso vigiar para que ninguém se ofenda, participar das discussões, esclarecer seus pontos e, em muitas vezes, defender a equipe. À medida que o site cresce, essa demanda aumenta exponencialmente e, sem uma equipe dedicada a gerenciar comunidades, precisamos escolher entre participar (e moderar) bem as discussões ou gastar mais tempo escrevendo o site em si1. E, honestamente, jornalistas costumam ser melhores escrevendo do que moderando – vide os debates entre candidatos nas eleições.
Além das dores de cabeça para os donos dos sites, há um outro problema decorrente de uma área de comentários desregulada: ela atrapalha qualquer discussão racional sobre determinado assunto. O assunto é cada vez mais discutido nos meios acadêmicos e na revista Science de janeiro, pesquisadores americanos chegaram à conclusão de que quanto mais quente é uma discussão, menos as pessoas que comentam refletem de fato sobre o assunto. Quando o tom sobe e as pessoas começam a falar em caps lock, a caixa de comentários vira um embate em que o objetivo é mostrar como sua opinião – e você, por conseguinte – é mais inteligente que o outro2. Isso tem a ver com nossos próprios instintos, mas também com o fato de que, como comentaristas, estamos travando discussões com desconhecidos em um território neutro. Respeitar ou mesmo não ferir o orgulho alheio não faz parte das prioridades, e muitas vezes o assunto original – que nem dominamos – fica em segundo plano.
Um fulano que você nunca viu comentando atrás de um pseudônimo engraçadinho dificilmente fará você mudar de opinião, por mais que exista um ponto ali. Mas se você levar a discussão para a seu próprio círculo de amigos, apresentando o tema com suas próprias palavras, o debate poderá ser enriquecido. Então, acredite: forçar a discussão para fora daqui é uma decisão consciente de design, boa para todas as partes. A ideia não é original, admito: roubei a lógica de David Karp3, o gênio precoce por trás do Tumblr. Também não há comentários no Tumblr, mas há feedbacks: é possível ver quem gostou ou comentou sobre um post seu, mas isso se dá na página de cada comentarista. Isso diminui bastante o nível de agressividade, segundo Karp: “se você quiser ser um babaca, você parecerá um babaca no seu próprio espaço, e deixará a minha casa limpinha”.
Se você tem alguma crítica ou correção ao que postamos e quer endereçá-la diretamente a nós (a chamada crítica construtiva, mesmo que seja braba), pode fazer por email ou Twitter. Dessa forma podemos ter uma conversa mais individual e civilizada. Quando discutimos de maneira particular, sem a pressão da platéia, sem termos que mostrar para todo mundo quem tem a razão, argumentamos de maneira mais honesta.
Se você achou legal o que leu aqui, ou engraçado, ou polêmico, ou fofinho, enfim, por favor, use esses botões de compartilhamento para continuar o diálogo com as pessoas que importam a você. Tuite o link com algum comentário, cole um pedaço do texto no Facebook, envie por email para sua família, por Tumblr, Google+ ou o que seja. Dessa forma, acredito, estaremos valorizando a sua opinião e diminuindo o ruído. O objetivo último do Oene, afinal, é deixar a conversa online mais interessante.
- Ok, há uma terceira opção também, adotada por portais de notícias: deixar a caixa de comentários aberta, mas ignorando tudo que é escrito ali. ↩
- Os cientistas responsáveis pelo artigo publicado na Science estudaram as reações de 2.000 pessoas a um artigo sobre nanotecnologia, e viu que quando a discussão nos comentários era inflamada, os leitores escolhia “um lado”, mesmo sem ter conhecimento sobre o tema. ↩
- David Karp desenvolve melhor a ideia neste artigo do NY Times. A noção de “crítica construtiva” do Tumblr se complementa com a adoção de ícones de coração, que apareceu antes do “curtir” do Facebook. ↩
dica do João Marcos
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