O evangelicalismo brasileiro apresenta características apreciáveis e preocupantes. Entre estas últimas está o gosto por novidades. Líderes e fiéis sentem que, para manter o interesse pelas coisas de Deus, é preciso que de tempos em tempos surja um ensino novo, uma nova ênfase ou experiência. Geralmente tais inovações têm sua origem nos Estados Unidos. Assim como outros países, o Brasil é um importador e consumidor de bens materiais e culturais norte-americanos. Isso ocorre também na área religiosa. Um movimento de origem americana que tem tido enorme receptividade no meio evangélico brasileiro desde os anos 80 é a chamada teologia da prosperidade. Também é conhecida como “confissão positiva”, “palavra da fé”, “movimento da fé” e “evangelho da saúde e da prosperidade”. A história das origens desse ensino revela aspectos questionáveis que devem servir de alerta para os que estão fascinados com ele.
Em 1968, o então jornal Ultimato, noticiando o aniversário de 17 anos da Mocidade Para Cristo, divulgou alguns dados da entrevista feita pela revista Manchete com estudantes universitários para reforçar “o já conhecido declínio da religião entre os jovens: três em cinco universitários reconhecem que são menos religiosos que seus pais, 40% declaram pertencer à religião apenas por tradição e 69% deles julgam que a humanidade se afasta cada vez mais das ideias de Cristo”.
Uma recente reportagem da revista Época (“Jovens redescobrem a fé”) cita dados da Fundação Getúlio Vargas para mostrar o atual fervor religioso dos jovens. Mais de 90% dos jovens brasileiros entre 20 e 24 anos declaram ter alguma crença. Em comparação com as outras faixas etárias pesquisadas, o número é o mais alto de todos. Dos jovens entre 20 e 24 anos, 14,16% se declararam evangélicos, 73,5% afirmaram que são católicos, 2,96% creem em outras religiões e 9,38% se definem como sem-religião.
Os dados obtidos pelo Instituto alemão Berelsmann Stifung, a partir de pesquisa feita em 21 países, coloca o jovem brasileiro como o terceiro mais religioso do mundo, perdendo para os nigerianos e guatemaltecos. Entre os jovens brasileiros, 95% se dizem religiosos e 65% afirmam que são profundamente religiosos.
Mas quem são, o que pensam e o que fazem esses jovens religiosos? E os jovens evangélicos? A pesquisa “Juventude Evangélica: crenças, valores, atitudes e sonhos”,* feita pela Editora Ultimato em julho de 2010, responde parcialmente a essas perguntas. Os resultados não podem ser generalizados. O que se tem é o retrato parcial de uma das juventudes evangélicas: jovens direta ou indiretamente ligados à editora. A esse viés se juntam a metodologia usada para a pesquisa (internet) e -- derivado de sua ligação com Ultimato -- o fato de se concentrarem nas igrejas históricas (apenas 19% são de igrejas pentecostais). Para exemplificar os contrastes entre essa amostra e a juventude em geral: entre os que responderam a pesquisa, a quantidade de jovens que estão cursando ou que já concluíram algum curso superior é de mais de 80% -- uma taxa inversa a da população brasileira total. (veja Passando a perna nas estatísticas).
Com isso em mente, é possível obter muitas informações e conclusões interessantes e surpreendentes!
A pesquisa
O questionário foi preenchido por 1960 jovens entre 13 e 34 anos. Todos os estados foram representados, sendo que os de maior representatividade foram São Paulo (20%), Rio de Janeiro (19%) e Minas Gerais (13%).
Ao todo, 61% deles moram com os pais -- quase a mesma porcentagem de jovens solteiros (68%). Dos motivos para a permanência na casa dos pais, 22% alegam não ter dinheiro para se sustentar sozinhos e 17% alegam ter um bom relacionamento com os pais e gostar da companhia deles. Entre os outros motivos alegados, alguns disseram não sair de casa porque ainda não casaram e alguns disseram que não podem sair porque apoiam a família financeira ou emocionalmente. Parece que eles estão cumprindo à risca a ordem: Deixará o homem a sua família...
Sobre ser jovem
As respostas às perguntas sobre a melhor e a pior coisa em ser jovem têm forte ênfase no futuro, como era de se esperar. A maioria respondeu que a melhor coisa em ser jovem é ter um futuro cheio de diversas possibilidades (65%). Quanto à pior coisa, 35% concordam que é a preocupação com o futuro e 32% acham que é a insegurança ou medo de tomar decisões. Apenas 2% acham que é não ter emprego e 3% que é o controle dos pais.
Entre as três atividades que mais ocupam os jovens nos fins de semana estão: ir à igreja (85%), navegar na internet (48%) e sair com os amigos (47%). As três atividades de um fim de semana ideal são: ir à igreja (91%), sair com os amigos (63%) e sair com o namorado (44%). As atividades de lazer estão mais restritas à televisão e à internet. A comparação entre o que é considerado ideal e o que eles de fato fizeram no último fim de semana revela um pouco de suas ambiguidades. Nem todas as atividades consideradas ideais estão entre as atividades realizadas. As maiores discrepâncias são: apenas 9% acham que navegar na internet é uma atividade ideal, mas quase 40% fizeram isso no fim de semana; apenas 4% acham que assistir televisão é uma atividade ideal, mas 28% disseram ter feito isso no fim semana; e 44% disseram que sair com o/a namorado/a é uma atividade ideal, mas apenas 19% disseram ter feito isso no fim de semana.
Sobre militâncias
A maior participação se dá em grupos e movimentos jovens vinculados a igrejas: cerca de 79% dos jovens participam, 14% não participam, mas gostariam de participar, e apenas 4% não gostariam de participar. A maior rejeição se dá com relação à participação em partidos políticos: 72% dos jovens não participam e não gostariam de participar. Os dados sobre a participação em movimentos ambientalistas, voluntários em ONGs e em trabalhos comunitários colocam em evidência o potencial mobilizador das organizações sociais para tantos jovens com predisposição de serem voluntários. Estranha-se a porcentagem de 29% para os que não participam e não desejam participar de movimentos ambientalistas, já que esta é uma opção tão em voga atualmente. A participação (32%) somada à predisposição para participar em movimentos estudantis (28%) é um dado surpreendentemente alto.
Segundo os jovens, os três principais problemas do Brasil são a distância de Deus (44%), a desigualdade social (13%) e a má administração pública (12%). Houve grande concentração em uma resposta religiosa, enquanto problemas mais estruturantes tiveram um índice relativamente baixo.
Sobre personalidades
Os entrevistados foram solicitados a citar o nome de uma pessoa, conhecida do público geral, brasileira ou não, que eles admirassem. As respostas citam principalmente personalidades ligadas à política, esporte, artes e literatura. Apenas quatro pessoas foram lembradas por mais de oitenta jovens (equivalente a 5% dos entrevistados), o que mostra grande diversidade de opiniões. O nome mais citado foi o de Marina Silva, admirada por 140 pessoas. Kaká foi citado por 119, Lula por 114 e Nelson Mandela por 81 pessoas. Jesus foi lembrado por 58 e Bono Vox por 45. Martin Luther King Jr. foi citado por quarenta e Angelina Jolie, por 22. Foram lembrados também os nomes de Cristovam Buarque (19), José Alencar (18), Silvio Santos (17), C. S. Lewis (17), Obama (17), Luciano Huck (13), Steve Jobs, Madre Tereza e Ayrton Senna (12), Bernardinho (11) e Lutero (10). Dez pessoas disseram admirar o próprio pai. Ao todo foram citados 240 nomes.
Entre as pessoas mais admiradas, conhecidas no meio evangélico, foram citados 340 nomes, e a dispersão de votos foi ainda maior, o que demonstra mais uma vez a falta de unanimidade. O mais citado é Silas Malafaia (105), seguido por Ana Paula Valadão (75), Kaká (56), Ariovaldo Ramos (53), Jesus (45), Ed René Kivitz (45) e Caio Fábio (43). Algumas pessoas dizem admirar Ricardo Gondim (38), C. S. Lewis (29), Ronaldo Lidório (27), Fernanda Brum (27), Russel Shedd (25), Marina Silva (25), Billy Graham (24) e John Piper (23). Dez pessoas disseram admirar o próprio pastor.
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