Invisíveis, até quando?

Um dos importantes avanços da obra missionária nestes tempos é o conceito de “todos em todo lugar”. Não mais “enviadores” e “receptores”, mas, como acentua o movimento de Lausanne, “toda Igreja levando todo o Evangelho a todo mundo”.
Mas, para que isto se torne uma realidade, é preciso, além de outros fatores, que as igrejas locais assumam a responsabilidade e o compromisso de gerar discípulos missionários. Proclamar o evangelho no mundo de hoje significa, entre outras coisas, chamar homens e mulheres a um discipulado cristocêntrico, encarnado e militante.
A metáfora utilizada por Jesus que mais confere significado a esta tarefa é a da pesca: “Vinde após mim e eu vos farei pescadores de homens” (Mt 4.19; Mc 1.17; Lc 5.10). O que ele faz é apropriar-se de uma imagem que já existia no Antigo Testamento (Jr 16.16; Ez 29.4; 38.4; Hc 1.14-15) e em seu cumprimento messiânico dá novo significado ao sentido anterior. A metáfora da pesca, que possuía um significado teológico de juízo de Deus, no projeto de Jesus representa a graça salvadora do reino de Deus, que se revela a todos.
O chamado de Jesus Cristo a uma vida discipular era, então, um convite ao relacionamento, para que seus discípulos andassem com ele. E o critério fundamental para discernir o Espírito na vida de cada discípulo e discípula era o quanto assumiam as opções, as prioridades e as escolhas que orientavam o próprio Mestre. Isto implicava a continuação da missão de Jesus mediante a vida e o ministério dos próprios discípulos.
Porém, desde os primeiros discípulos, em cada geração e contexto, nos deparamos com alguns “pontos cegos” no cumprimento desta tarefa. São âmbitos da sociedade, indivíduos, grupos ou classes, que permanecem invisíveis, de forma intencional ou não, à ação cristã.
Precisamos rever questões importantes: Por que, em muitos países, ainda excluímos os surdos, os autistas, os surdo-cegos, entre outros, da oportunidade de acesso ao evangelho? Por que alguns grupos minoritários nas zonas urbanas ainda podem ser considerados não alcançados? E o mesmo vale para as classes sociais, os ricos e os pobres dependendo do contexto, os ciganos etc. Já não são raras as iniciativas que buscam atenuar algumas destas demandas, mas muito ainda precisa ser feito.
O primeiro passo é refletirmos, em humildade e dependência do Espírito, se temos negligenciado algo ou alguém em nossa ação. Será que no serviço que prestamos existe algum ponto cego? Se existe e é fruto de nossa pecaminosidade (orgulho, egoísmo, preconceito, etc.), carecemos de confissão e reconciliação; se é fruto de nossa omissão, necessitamos do discernimento do Espírito e de uma reorientação na vida cristã.
Além disso, precisamos nos mover, buscar um ângulo de visão que nos aproxime de Cristo e nos conecte à realidade de tal forma que possibilite enxergar a missão em sua globalidade e integridade.
“Todos em todo lugar” interpela cada cristão a assumir-se como instrumento desta missão, que brota do amor trinitário. Que, a partir de seu encontro transformador com Jesus Cristo, se torne um discípulo missionário e, em todas as dimensões da existência humana, anuncie a vida plena.
• Alcir Souza, casado com Ana Claudia e pai de Lucas e Ana Karis, é professor do Centro Evangélico de Missões, em Viçosa, MG.

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