Entre o real e o imaginário
Uma comunidade em um site de relacionamentos revela: mais de 700 pessoas já
tiveram medo do escuro. A exposição desse sentimento no mundo virtual
desmistifica a relação do medo com a covardia e demonstra que a reação é normal
e comum, independente de idade ou sexo. “O medo é uma reação instintiva
essencial, que nos prepara fisiologicamente para lutar ou fugir diante de
situações ameaçadoras. É um estado emocional que ativa os sinais de alerta do
corpo diante dos perigos”, define a psicóloga e instrutora da Sociedade
Brasileira de Programação Neurolinguística, Walkyria Coelho.
Se entre os adultos essa sensação muitas vezes não tem sentido ou razão
lógica, para as crianças o motivo é ainda menos aparente, visto que na infância
é difícil distinguir as fronteiras dos mundos real e imaginário. “É natural que
o medo apareça mais forte quando acontece algum evento: quando a criança
escorrega e cai na piscina funda ou se perde dos pais na praia. Criança também
aprende por imitação e, por perceber o desespero dos adultos diante da situação,
pode desenvolver um padrão de resposta fóbico”, explica.
Segundo Walkyria, o papel dos pais é fundamental para ajudar a criança a
enfrentar os temores. A tarefa nem sempre é fácil, requer dedicação e muita
paciença, pois qualquer excesso pode ser prejudicial: repreender o filho por
julgar o medo como “manha” ou superprotegê-lo com a permissão para dormir junto
com os pais pode desencadear desequilíbrios psicológicos e emocionais e piorar
ainda mais o quadro. “É importante ouvir e respeitar o sentimento da criança,
para depois buscar a melhor forma de conversar com ela sobre aquilo que a
amedronta”, sugere.
Limites
Por outro lado, estabelecer limites faz parte do
processo educacional. É fundamental apontar os reais perigos e mostrar formas de
evitá-los. Orientar que as escadas, piscinas, tomadas e janelas podem
representar riscos, por exemplo, é importante, mas deve ser feito com segurança
e carinho, sem obrigar a criança a enfrentar seus medos. “Expor a criança a
situações nas quais ela se sinta insegura só vai causar sofrimento e ansiedade.
Um medo que poderia ser superado no processo natural de desenvolvimento, pode se
transformar em um medo fóbico, deixando-a mais assustada e agitada”, justifica
Walkyria.
Para a psicóloga, utilizar o medo para obter a obediência dos filhos, com
frases de efeito como “se você não me obedecer, vou deixar o bicho te pegar” ou
“o monstro vem te assustar, porque ele não gosta de criança desobediente”, não é
uma atitude correta. O diálogo e a paciência devem ser priorizados pois,
geralmente, um simples abraço acaba sendo suficiente para afastar os perigos,
sejam reais ou imaginários “A criança supera a ansiedade, a insegurança e medos
menores com o apoio e amor dos pais, pois os adultos significativos representam
criaturas poderosas, capazes de protegê-las de qualquer coisa que as ameace”,
tranquiliza.
E é com muito amor e carinho que Simone Bartz, 37 anos, procura desmistificar
os mistérios da escuridão para os filhos Pedro e João Bartz Bender, de 10 e 6
anos respectivamente. Ela lembra até hoje da sua infância, onde enfrentou o medo
do escuro sem apoio. “Tento tomar como lição a minha infância, pois não quero
que meus filhos passem o mesmo que eu passei”, conta. Para isso, ela tenta
transparecer calma e tranquilidade frente aos episódios de medo das crianças.
“Muitas vezes são os pais que passam seus medos para os seus filhos”, acredita.
Com um abajur no quarto, Simone dá liberdade para Pedro e João dormirem com um
pouco de claridade caso acharem necessário. “Mas explico que não há o que temer
no escuro e deixo claro que depois que eles pegarem no sono eu vou desligar o
abajur”, complementa.
Fonte: Jornal Gazeta do Sul
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